26 de abril de 2015

"Sete Vidas" elimina vilão e quebra padrão das telenovelas da Globo



Leve, quase despretensiosa. Assim pode ser definida a maneira como Sete Vidas, atual trama das seis da Globo, vem sendo conduzida até aqui. O drama central da novela poderia ser carregado e exagerado, mas Lícia Manzo, a autora, soube trabalhar com delicadeza e não deixou sua história descambar para esse lado.
O primeiro fato a se reparar é que Sete Vidas prescinde de vilões, e tal ausência não causa propriamente um problema para o folhetim. Pelo contrário, consegue tornar a narrativa mais interessante, subvertendo um dos pilares mais básicos do melodrama: o confronto entre o bem e o mal. No lugar dos malvados, Lícia elaborou uma trama em que os próprios enredos cotidianos criam impeditivos fortes o suficiente para que os personagens encontrem a felicidade só no último capítulo e, assim, movimentem a história.
Se tomarmos como exemplo o caso dos mocinhos Julia (Isabelle Drummond) e Pedro (Jayme Matarazzo), o romance deles não acontecia não por causa de armações de alguém, mas pelo simples fato de os dois acreditarem serem irmãos. É bem verdade que o afastamento do casal e o envolvimento deles com outros parceiros, Edgar (Fernando Belo) e Taís (Maria Flor), vieram para complicar ainda mais o meio de campo para eles.
Agora, com a verdade revelada, Julia e Pedro têm de administrar suas histórias e, como ela própria disse, vão “ter que machucar muita gente para ficarem juntos”.
Por outro lado, Ligia (Débora Bloch) sofria com a ausência de Miguel (Domingos Montagner), mas mesmo assim tocou a vida, acreditando que o amor dela estivesse morto. Casou-se com Vicente (Ângelo Antônio) e tenta viver com ele uma relação que idealizava levar com o navegador. O casamento é mais calcado na amizade do que no amor, pelo menos da parte dela.
A volta de Miguel, porém, baguncará a normalidade em que Ligia tentava se manter, e mais uma vez a força do cotidiano, embalada por soluções folhetinescas, torna-se um componente importante dentro de Sete Vidas.
Outra característica interessante: o comportamento solitário e o jeito arredio de Miguel o afastam de outros personagens e tornam-se um conflito natural para que as histórias em torno do personagem se desenvolvam. O envolvimento superficial dele com Marina (Vanessa Gerbelli) é uma prova. Miguel é, assim, o herói e seu próprio vilão dentro da história.
Há, obviamente, personagens contraditórios, o que só engrandece a construção dos tipos de Sete Vidas. Exemplo disso é Marta (Gisele Fróes), a mãe de Julia, que escondia da filha a verdade sobre sua origem. Os embates entre as duas exacerbam a qualidade dos diálogos da autora.
Aliás, embates entre mãe e filha parecem ser uma especialidade de Lícia, vide a relação conflituosa de Manu (Marjorie Estiano) e Ana (Fernanda Vasconcellos) com Eva (Ana Beatriz Nogueira), em A Vida da Gente (2011).
Como nem tudo é perfeito, cabe apontar três problemas que Sete Vidas apresenta: o primeiro é a ausência de ganchos entre os blocos de intervalo. Em segundo, a direção arrastada e vagarosa de Jayme Monjardim. Por fim, a narrativa torna-se cansativa quando Miguel começa a discursar sobre as pesquisas de cunho ambiental das quais participa. Tais cenas quebram o ritmo e pouco acrescentam à história.
Mas, de um modo geral, Lícia Manzo teceu uma complexa e engendrada psicologia dos personagens dentro de uma estrutura folhetinesca ousada. Sem intenção (e em menor grau do que Avenida Brasil e Cheias de Charme, em 2012), ela inova e oxigena o gênero

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