Os reflexos de Dercy, que morreu em 2008, com 101 anos, em Regina são antigos, e a admiração era uma via de mão dupla. Segundo a apresentadora, as duas se frequentavam e batiam altos papos, o que, de acordo com ela, contribuiu para que fosse uma profissional melhor. A filha da humorista, Decimar Gonçalves, de 80 anos, reafirma o carinho mútuo.
— Mamãe adorava Regina — diz Decimar, que fala com carinho da mãe famosa e desbocada: — Ela era uma mulher muito feliz. Um dia antes de morrer (vítima de uma pneumonia), estava no bingo.
— Tivemos a oportunidade de conviver muito, conversar sobre a vida. Quando estreei o “Programa legal”, em 1991, fiz uma ótima entrevista com ela, que cantou o “Rap das aranhas”. O que eu aprendi com ela é saber o momento exato de usar o caco (um improviso no texto). Se ele for melhor que o texto, use. Aprendi a ter coragem de usá-lo ao vivo na televisão. Dercy me ensinou a ter o mínimo de julgamento e muita coragem.
— Acho que Dercy reconhecia em mim uma pessoa que tinha a ver com o humor dela. Ela não tinha um método, mas a loucura de falar o que desse na telha. Uma mulher livre! E o domingo é o dia mais varejão e popular da semana, em que o público é menos específico. É a geral! Nós duas somos populares — compara Regina.
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, peça fundamental para transformar a Globo em umas das maiores emissoras de televisão do mundo, deposita em Dercy Gonçalves a responsabilidade de a empresa ter se destacado entre as emissoras da época de sua inauguração. Amigo da comediante e apresentadora, ele contou na autobiografia “O livro do Boni” que sua ida para a Globo, em 1967, foi acelerada pela própria atriz, em pedido ao então todo-poderoso do canal, Walter Clark.
— Dercy é a rainha absoluta entre as comunicadoras femininas, dominou plateias. Sua especialidade sempre foi o teatro e a comédia. Mas, como comandante de auditório, mulher alguma chegou perto dela. Dercy foi completa! Ainda quando a Globo engatinhava, Walter Clark se apoiou em Dercy. Pode-se dizer que ela foi o gatilho da ascensão da Globo. Perseguida pela censura, teve que sair do ar no auge de sua carreira. Voltou e, com sua personalidade, brilhou em novelas como “Que rei sou eu” (1989) e “Deus nos acuda” (1992) — lembra Boni.
Para o ex-vice-presidente de operações da Globo, a ousadia da comunicadora nunca foi um problema para a emissora, e, segundo ele, Regina Casé resgata a tradição da televisão aos domingos.
— Dercy era inteligente e entendia os limites, embora sofresse com os absurdos da censura. Regina é um talento! Fez coisas incríveis na Globo, e o “Esquenta!” resgata corajosamente a tradição dos programas de auditório — elogia Boni.
Para as próximas gerações de apresentadores, ele ensina: é importante o profissional ter a consciência de absolutamente tudo o que vai acontecer.
— Tem que ter o domínio total do programa para não se perder. Só assim é possível imprimir o ritmo necessário para conduzir a atração com permanente interesse para a audiência. Auditório é um mero acessório da atração. Não é para ele que o programa deve ser feito, mas para o espectador que está em casa — afirma Boni.
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